22 agosto 2008

Além das sombras daquele quarto



Um quarto escuro, um garoto sentado no chão.
Sim, este sou eu
Abraçando meus joelhos, calado.
Esta figura patética sou eu.

Engolido e fechado dentro de mim mesmo
Sinto-me distante e vazio
Sinto duas confusas almas dividindo este corpo

Uma alma que ama
A mesma alma que criou um castelo de navalhas pra mim
Uma alma que teme
A alma que chora e foge pra longe dentro de mim

Ainda não acenderam as luzes e tudo fica mais frio
O silêncio me acalma e me domina.
Estou ficando louco?

Lembranças que eu fingia não ter
Saudades que eu fingia não sentir
Cada verdade que eu fiz mentira
Todas elas gritando ao mesmo tempo pra me acordar
Eu tenho medo de sair
Tenho medo de acordar e olhar nos olhos dela

Um quarto escuro, trancado por dentro.
Sim, fui eu quem o fechou
Abraçando meus joelhos
Este sou eu isolado por minhas próprias escolhas

Um vento frio, uma brisa
Um aroma que eu já não sentia a muito tempo
Está ficando mais claro, mais quente...

Posso abrir os olhos agora.
E até que não estava tão escuro assim
Não posso sair pela mesma porta por onde entrei.
Ainda está trancada

A luz ainda fraca revela as cartas que ela deixou pra mim
Ali, em baixo da porta
Fui eu quem não as vi, fui eu quem não abriu os olhos

Um grito! Meu nome
É ela! É ela lá fora, posso vê-la da janela.
Ela estava perto o tempo todo, eu é quem não podia sentir

Sinto vontade de chorar por não saber o que fazer ou dizer
E ela me mostra uma nova forma de viver
Ela toca meus lábios e me diz com a voz calma:
Por que não tentou apenas sorrir?

Felipe Gangrel para Luiza Souza

01 agosto 2008

Identidade




Eu sou a águia pairando imponente
E o sangue em minhas garras e a lebre que levo
não diminuem minha beleza
E eu não poderia ser se não fossem meus instintos

Eu sou o sol amarelo no desenho da criança
Feito com giz de cera, preso na porta da geladeira
Ainda sim com um sorriso inexplicável
E eu não poderia ser se não fosse a pureza

Eu sou o seu cão que te espera chegar do trabalho
Eu te vejo como o único amigo
E tudo o que te peço agora é um carinho
E eu não poderia ser se não fosse meu amor verdadeiro por você

Eu sou cada lágrima que você chora
Eu escorro pelo seu rosto, desapareço
Mas se sou sincera não sou esquecida
E eu não poderia ser se você não tivesse motivos pra chorar

Mas eu também sou o sorriso
De quando você encontra alguém por quem sente saudades
O sorriso de quando você vê um filhote ou um bebê
E eu não poderia ser se você não soubesse sorrir

Eu sou meus amigos e eu bebendo
Sem motivos pra beber, sem memórias ruins pra esquecer
E quer saber? Não me importam mais os motivos
Simplesmente estamos aqui e isso já basta

Felipe Gangrel

Difícil



Está cada vez mais difícil ser este eu
Este meu eu que cultiva a distância
Entre o eu e com quem convivi e prometi amar pra sempre
Mas até quando o sempre dura?

Está cada vez mais difícil saber até quando
Até quando meu jeito calado
Vai levar você pra mais e mais longe de mim
E onde será que eu vou te encontrar outra vez?

Está cada vez mais complicado encontrar um lugar
Onde as lembranças tuas não existam
Está cada vez mais fácil me perder nas palavras
Quando lembro de você

Foram tantas as vezes que dissemos “te amo”, e agora?
Bem, agora há muitas perguntas sem resposta
E a única certeza que tenho
É de que ainda te amo, mas ainda não sei definir o quanto


Felipe Gangrel

Meu amigo Pedro



Sentado na varanda tocando sozinho seu violão
Com cara de quem acordou agora mesmo
No embalo das cordas
Está vendo ele ali? É meu amigo Pedro.

Fala o que quase ninguém entende
E fala com a simplicidade de uma criança
Fala baixo pra ninguém ouvir
E fala com o vento, porque este sim pode escutá-lo.

Calado ele continua enquanto apenas as seis cordas falam
Pra puxar conversa eu digo:
Essa brisa está bem calma, não acha?
E ele parece nem ter escutado o que eu disse.

Trago meu violão comigo
E já nos primeiros acordes ele me acompanha
O esboço de um sorriso em seu rosto logo surge
Isso ele não pode esconder

Pedro, olhe lá quem vem chegando
E você que pensava estar sozinho
Agora em meio a uma roda de violão
Encontrou muitos iguais

Diferentes sons e timbres
Diferentes ideais e razões
Mas nada além de estar aqui importa
Amigos que agora e sempre serão seus também

Eles, assim como eu, não vieram à toa
Não vieram porque alguém os pediu
Demoraram sim pra chegar
Mas pense. Eles estavam a caminho

Felipe Gangrel para Pedro Calegaro